Legislação

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“A proibição mata mais do que qualquer droga”

Nosso dever

“Teu dever é lutar pelo Direito, mas se um dia encontrares o Direito em conflito com a Justiça, luta pela Justiça”

– Eduardo Juan Couture (Texto extraído do Habeas Corpus de cultivo individual da Clarian – o primeiro de SP 2016)

Art. 227 É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão

Como está o cenário atual no Brasil?

Atualmente a lei brasileira permite que pessoas comprem medicamentos feitos a partir da cannabis, ou ainda importar suplementos alimentares também produzidos com a planta. Mas esses produtos são caros, e só quem é rico consegue acessar.

A Anvisa é a agência que deve regular o comércio de medicamentos no Brasil, sendo assim, é essa Agência que regula também os componentes da cannabis e seu uso terapêutico.

O início da mudança se deu em 2015, com a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) da Anvisa, que retirou o canabidiol (CBD) do rol de substâncias proibidas e o incluiu na lista C1, lista referente às substâncias sujeitas a controle especial. Ainda em 2015 a Anvisa estabeleceu os critérios para a importação “de produtos à base de canabidiol em associação com outros canabinoides, dentre eles o THC”.

Em 2017 a Anvisa registrou o primeiro medicamento fitoterápico que contém THC e CBD. Os compostos são absorvidos pela mucosa oral e são indicados para espasmos em decorrência da esclerose múltipla.

Já em 2019 (RDC 327) criou uma modalidade de inclusão de produtos à base de cannabis nas farmácias. Em 2020 (RDC 335) a agência redefiniu e facilitou o processo de importação de produtos que contém os componentes da cannabis.

Um tratamento médio mensal com esses produtos regulados pode custar cerca de dois salários mínimos, alternativa que se mostra inviável para a realidade da população.

O acesso à cannabis e seus componentes para fins terapêuticos e de pesquisa, embora legais, são extremamente desafiadores, seja pelo viés econômico, cultural ou burocrático.

Existem dezenas de projetos em tramitação dentro das casas legislativas estaduais e federais que debatem os formatos de acesso aos componentes da cannabis para fins terapêuticos, sendo o principal e mais conhecido o PL 399/2015. Este projeto pretende regulamentar o cultivo da planta para fins medicinais, terapêuticos, industriais e científicos no Brasil (mesmo ainda não sendo a proposta ideal, demonstra um pequeno avanço político na luta pela regulamentação).

É consenso entre progressistas, liberais e conservadores a compreensão desse potencial terapêutico e como pode proporcionar qualidade de vida e bem-estar para pessoas com enfermidades crônicas, de difícil controle e para toda sua família.

A CULTIVE existe por compreender a necessidade e a urgência na obtenção da cannabis e seus derivados para uso terapêutico, sempre considerando as dificuldades e impedimentos em obter tais produtos e seus benefícios.

A CULTIVE preza pela autonomia de seus associados, pelo acesso a um remédio de qualidade e sem custos para aqueles que mais necessitam.

Para outras finalidades a cannabis segue proibida e a política de guerra gerada propositalmente ao redor dela segue matando e encarcerando de maneira sistemática e seletiva homens e mulheres, jovens, negros, indígenas e periféricos de todo o Brasil.

Habeas Corpus para Cultivo coletivo dos associados da Cultive

No início de 2021 a Cultive obteve decisão inédita no âmbito da Justiça criminal – um Habeas Corpus (HC) coletivo da Associação que contempla 21 de seus associados. “Diferentemente das ações da esfera cível já promovidas, esta decisão representa o reconhecimento da Justiça criminal de que cuidar da própria saúde não pode ser considerado crime”, explica o advogado Ricardo Nemer, um dos integrantes da Reforma (Rede Jurídica pela Reforma da Política de Drogas) que assina este pedido de habeas corpus.


Na prática, esta decisão sentencia que a Cultive tem permissão para realizar todos os processos necessários para garantir acesso ao remédio à base de cannabis aos integrantes contemplados e nomeados no HC. Isto significa que seus representantes não poderão ser presos pela realização de tais práticas.

Portanto, desde o dia 5 de Fevereiro de 2021 as Polícias Civil e Militar estão proibidas de realizar a prisão em flagrante dos associados contemplados no HC e dos responsáveis da Cultive.

Para a juíza Andrea Barrea, do Departamento Técnico de Inquéritos Policiais e Polícia Judiciária do Tribunal de Justiça de São Paulo, o HC movido pela entidade busca “a efetivação do princípio da dignidade, bem como dos direitos à vida e à saúde, os quais devem prevalecer sobre a proibição de se cultivar a planta de onde se extrai a substância utilizada especificamente para o tratamento dos pacientes em um contexto de necessidade, adequação e proporcionalidade”. A medida também proíbe a apreensão de equipamentos e componentes da cannabis utilizados para o cultivo destes 21 associados da organização (todos com suas documentações em dia).

 

Entendendo um pouco mais os fundamentos deste pedido/decisão 


Ações judiciais como essa têm base na lei 11.343 de 2006, pois ela prevê que a União pode autorizar o plantio “exclusivamente para fins medicinais ou científicos, em local e prazo predeterminados e mediante fiscalização.”

Ademais, desde 2014 o Conselho Federal de Medicina autoriza a prescrição de canabidiol para crianças e adolescentes com epilepsia refratária ao tratamento convencional. A partir de 2015, a importação de óleos e extratos à base de derivados da cannabis no país, como o CBD (canabidiol), é permitida pela Anvisa mediante apresentação de laudos e receita médica.

Os custos altíssimos dos produtos e do valor de importação fazem com que muitos pacientes recorram ao autocultivo ou até mesmo ao mercado ilegal.

Outras substâncias, como o THC, ainda são vistas com preconceito, por terem efeitos psicotrópicos — mesmo sabendo hoje que crescem cada vez mais os estudos sobre efeitos terapêuticos da substância.

Vale dizer ainda que a produção artesanal, doméstica ou em coletivos de cannabis democratiza o acesso ao extrato da planta e seu potencial terapêutico. Usado em seu espectro completo, o óleo da planta é considerado mais eficaz e seguro do que os compostos isolados.

“Vivemos um cenário, onde milhares de pessoas, sobretudo aquelas hipossuficientes, não tem acesso a um composto que, segundo pesquisas, muito lhes seria benéfico, enquanto burocratas travam discussões desordenadas, alheios às dores e árduas batalhas diárias destes cidadãos, tornando a dignidade acessível àqueles que podem pagar […] Em termos de perdas de conquistas civilizatórias, o direito, através do Poder Judiciário, deve fazer valer sua história de ciência de vanguarda, bradando em defesa do saber científico e afastando entraves burocráticos, com o fim de garantir a prevalência do princípio da dignidade Humana.” – Juíza Andrea Barrea, em trecho da decisão do Habeas Corpus da Cultive, expedido em 05 de fevereiro de 2021.

Número de HC’s individuais



Quando falamos de autocultivo, estamos falando de um processo complexo para obter liberação legal, no qual é preciso entrar em contato com um advogado ou a defensoria pública, verificar as condições necessárias para conseguir a autorização e, então, impetrar um habeas corpus (dar entrada no pedido na justiça). 

Segundo os últimos dados que possuímos (28/09/2021), existem aproximadamente 450 pessoas com permissão para cultivar cannabis para uso terapêutico e pessoal, permitindo dignidade e saúde para uma série de pacientes e suas famílias no Brasil. (Dados Relatório Cannabis Medicinal 2021 – Kaya Mind)

Fonte: https://kayamind.com/cannabis-para-fins-medicinais-relatorio/